A EXPEDIÇÃO À INDIA DE 1497-1499 (MANOEL DE OLIVEIRA CAVALCANTI NETO)

ILUSTRAÇÃO

Os europeus dominaram o Atlântico, uniram o mundo ao chegarem à Índia em 1498, quebraram a barreira dos oceanos e promoveram a globalização, embora a comunicação ainda fosse lenta e demorada. O conhecimento adquirido pelos nautas portugueses, muitas delas nas viagens secretas pelo Atlântico Sul, entre 1488, quando Bartolomeu Dias contornou o Cabo da Boa Esperança e navegou por 800km na costa Oriental africana e em 1497, quando partiu a expedição com destino à Índia. Para muitos as viagens estavam restritas à Mina e ao Golfo da Guiné. Entretanto, concordaram quanto a necessidade da grande volta ao mar para uma navegação rápida e segura para escapar das calmarias e ventos de baixa intensidade, próximos do Equador e em latitudes mais ao Sul, que variavam ao longo do ano.

A expedição que partiu de Lisboa em 8 de julho de 1497 era composta da nau São Gabriel, sob o comando de Vasco da Gama tinha como piloto Pero de Alenquer, da nau São Rafael, comandada por Paulo da Gama e como piloto João de Coimbra, da caravela Bério, comandada por Nicolau Coelho e como piloto Pero Escobar e da São Miguel, ‘naveta’ de mantimentos, sob o comando de Gonçalo Nunes e como piloto Afonso Gonçalves, ‘naveta’ essa, que viria a ser queimada na costa Oriental africana depois de transferir os suprimentos para as naus e aa caravela. Partiu, acompanhada por Bartolomeu Dias que seguia numa caravela, oficialmente rumo à Mina, seguindo a rota já experimentada pelos anteriores exploradores ao longo da costa de África, mas segundo alguns autores em missão secreta d’além mar.

Estevão da Gama, Cavaleiro da Ordem de Santiago, alcaide-mor de Sines, foi escolhido por D. João II, porque era o homem certo na missão certa, para chefiar a expedição à Índia, mas morreu antes. Conforme a tradição medieval a missão seria transmitida para o primogênito Paulo, que abdicou do comando por motivo de saúde, em nome do irmão Vasco, famoso pela sua crueldade e rigidez. D. Manuel, que conhecia Vasco, aceitou a troca, desde que Paulo acompanhasse a expedição com Nicolau Coelho, Pero de Alenquer e Pero Escobar.

Paulo da Gama, navegador e negociador reconhecido, teve papel preponderante durante a longa viagem até a Índia, contornando e resolvendo problemas como dedicado conselheiro do irmão. Quanto a Vasco da Gama., as poucas fontes coevas disponíveis, que se referem à sua existência antes de 1497, não o citam como fidalgo da Casa Real e Cavaleiro da Ordem de Santiago, indicando que foi encarregado de policiar os portos portugueses na costa africana e defende-los contra os navios piratas, tendo participado na apreensão de barcos franceses no início da década de 1490 em retaliação às depredações feitas em tempo de paz contra a navegação portuguesa. N’Os Lusíadas, uma epopeia camoniana, Vasco é exaltado e elevado e consagrado como ilustre, chegando ao limite do divino, que evoca, também, em menor grau, Duarte Pacheco Pereira – o Aquiles português, D. Francisco de Almeida, D. Lourenço de Almeida, Afonso de Albuquerque, e Lopo Soares Albergaria e outros influentes no reinado de D. Manuel. Paulo da Gama é citado, vindo após o épico camoniano e do personagem Vasco da Gama, mas de forma bem mais discreta.

Superados os limites de Bartolomeu Dias, na costa Oriental africana, o trajeto da expedição estabelecia um novo marco, que conectava com rotas anteriormente não exploradas pelos portugueses e promoveriam o intercâmbio comercial com a Índia. Em Calicute, Paulo da Gama recebe o catual, que vem visitar a frota portuguesa, juntamente com parentes do samorim, o rajá local, para se inteirar da finalidade daquela viagem. Paulo da Gama, experiente navegador e negociador, dá ênfase aos feitos heroicos portugueses e a descoberta do caminho marítimo entre a Europa e a Índia, o que significaria um forte laço comercial, além de explicar o significado das imagens pintadas nas bandeiras que adornavam os barcos o a descrição do brasão luso.

Enquanto isso, Vasco vai à terra para uma audiência com o samorim para propor aliança, levando quinquilharias, como faziam na África, exaltando a riqueza e o poder do monarca português, o que surpreendeu e irritou Samutiri Manayikraman, por considerá-los inadequados, sendo retrucado de maneira descortês por Vasco, que cometeu assim uma gafe, provocando um desentendimento com os anfitriões, fazendo com que fossem detidos e trancafiados. Ao tomar conhecimento, Paulo deteve o catual e os nobres para depois ser feita a troca dos reféns e assim realmente começarem as negociações, num clima mais amistoso.

Em 29 de agosto de 1498, iniciaram a viagem de volta, com as embarcações repletas de especiarias, tecidos e pedras preciosas. Após um breve confronto com barcos, e devido aos danos e baixas na tripulação, a nau São Rafael foi abandonada e destruída com praticamente toda a carga. Após contornarem o Cabo da Boa Esperança, chegaram ao Cabo Verde, em meados de abril de 1499 com a Nau São Gabriel e a Caravela Bério em más condições de navegabilidade em face da longa viagem que fizeram. Até então os portugueses não tinham percorrido, pelo menos oficialmente, tão longo percurso em uma única viagem. Em face disso, e pelo estado de saúde de Paulo da Gama, separaram-se e Vasco da Gama partiu em uma caravela que oferecia melhores condições, com o irmão e uma tripulação de sua confiança, com o intuito de chegarem a Lisboa mais rápido e com segurança, no entanto, o estado de saúde de Paulo se agravou pararam no arquipélago dos Açores, onde Paulo da Gama foi a óbito. Permanecendo ali por vários meses.

No início de julho de 1499, a Bérrio chegava finalmente a Lisboa, seguida em finais de agosto pela nau São Gabriel. Vasco da Gama somente em setembro, que não teve grande recepção pois o impacto do sucesso da expedição já era notícia há mais de se dois meses. Isso o contrariou, fazendo-o recolher a um mosteiro alegando que estaria pranteando o irmão Paulo, que faleceu na Ilha Terceira.

Depois do retorno da Índia, Vasco, já famoso, recebeu honras e uma terça anual de 300.000 reais, uma fortuna na época. Em 1500, recebeu o tratamento de Dom e o título honorífico hereditário de Almirante da Índia. O rei prometeu-lhe um título nobiliárquico, mas só depois de comprar terras com recursos próprios ao Duque de Bragança, correspondentes às Vila da Vidigueira e a Vila dos Frades, em 1519 foi feito o primeiro Conde da Vidigueira por D. Manuel, título hereditário aos seus herdeiros e sucessores, sendo o primeiro Conde português sem sangue real.

Quis construir uma casa em Sines, cujo senhorio era D. Jorge, Mestre da Ordem de Santiago e Administrador da Ordem de Avis, desde 1492, mas D. Jorge não permitiu que ele a construísse, embora fosse próximo de Vasco, e foi apoiado por D. Manuel que não queria atrito D. Jorge, por ser considerado Pessoa Real, visto ter sido legitimado por seu pai, tanto que em 1500, sagrou-o 2.º duque de Coimbra, a fim de cumprir os últimos desejos do testamento do seu primo e cunhado D. João II.

A expedição de 1497-1499 foi decisiva para comunicação entre continentes e um dos momentos-chave da história global. De fato, ainda não substituindo absolutamente o comércio de especiarias no Mar Vermelho e no Mediterrâneo Oriental, a verdade é que ela transformou os portugueses em intervenientes ativos nos mares orientais e aproximou e intensificou os contatos entre os dois continentes.

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