COMIDA NATURAL? TÔ FORA! 

 

Por Minervino Wanderley 

 Gregório é um querido amigo e gosto de conversar com ele sobre suas aventuras. O chato é que ele tem uma tendência enorme para se sair mal no fim das histórias. Além do mais, é um incorrigível mulherengo e, por conta disso, já passou por situações deveras constrangedoras. No nosso último encontro ele me relatou sua mais recente peripécia.  

Conta ele: 

Meu amigo Minervino, há todo tipo de gente nesse mundão de meu Deus. E, dentre toda essa diversidade, existe um grupo que ama a Natureza, só come alimentos de origem vegetal, gosta de cinema de arte, etc. Bem, estou com esse arrodeio somente para lhe contar uma experiência que tive com uma moça adepta desse “modus vivendi”.  

Era uma tarde ensolarada de uma sexta-feira e resolvi começar a dar umas andadas no Parque das Dunas. Aliás, Bosque dos Namorados é mais bonito, não é? Pois bem. Estava eu lá a caminhar e a ouvir as conversas dos outros. Não por vontade própria, mas é que eles falam alto demais. Pode conferir. Dá todo tipo de fofoca, marido reclamando da mulher, mulher reclamando do marido e por aí vai. Mas deixa isso pra lá. 

Mais na frente encontro o tradicional gordo das caminhadas. Sempre tem um. O bucho do cara não cabe em nenhuma camisa. Pode ser Super G, Extra GG e nada. Tudo cai nele como se fosse uma baby-look. Ora, lá estou eu olhando a vida dos outros. Tenho que olhar para meu umbigo. Fiz isso e, por precaução, dei uma encolhida na barriga. 

Foi aí, meu compadre, que eu tive uma verdadeira visagem. Me belisquei umas três vezes para acreditar. Rapaz, era uma deusa muito linda que estava fotografando umas plantas. Pelas roupas – calça jeans velha e uma camiseta com uma imagem da Terra na frente – logo deu para deduzir que ela pertencia àquela turma de adoradores da Natureza. Que fosse! Cada um escolhe seu caminho. Além do mais uma coisa formosa daquela poderia ser o que quisesse. Olhei mais uma vez e não resisti. Conversei com meus cadarços e tomei a decisão: “Vou chegar junto!” Assim fiz. Aproximei-me como quem não quer nada e comentei: 

 – Documentando a Natureza? – ela mal olhou. Não desisti: 

– Como seria bom se todos tivessem essa idolatria pelas coisas simples e belas da vida. – ela levantou-se e indagou: 

 – Você também gosta? – olhei bem para aquela beleza e respondi com toda a sinceridade: 

 – Adoro! 

 – Que bom. Gosto de pessoas sensíveis. 

Aí eu vi que não havia retorno. Tinha que ir em frente. E comecei o repertório de mentiras: 

– Gosto de lugares onde tenha pouca gente. Só assim podemos admirar essas belezas. Adoro me sentar numa praia no fim de tarde e, sozinho, apreciar o cair do sol. Chego a me emocionar.  – ela já me olhou de forma diferente. 

– Puxa! Quanta sensibilidade. É raro encontrar pessoas assim. – dessa vez ficamos frente a frente.  

A mulher era um espetáculo. E usava a camiseta sem nada por baixo. Uma covardia! Fiz de conta que estava encabulado e passei a vista pelos dois pedaços de pecado. Senti um calafrio da sola do pé ao (resto) dos cabelos da cabeça. Fiquei mais animado ainda e perguntei:  

 – Vem sempre aqui? 

– Às vezes. Sou como você. Não gosto de muita gente. Aliás, já estou de saída, mas dá tempo de tomar uma água de coco. Acho que é única coisa natural que tem por aqui. Vamos? – ela propôs. 

 Aceitei com olhar crítico: 

– Claro que sim. Isso é o que devemos tomar no nosso cotidiano! Esse povo só quer saber de refrigerante, polpa industrializada, essas coisas que são danosas à saúde. Bom é suco da própria fruta. – disse eu, cínico, já que, na verdade, o pensamento estava numa coca-cola zero que me esperava na geladeira. Mas a deusa merecia um sacrifício e preparei-me para encarar a tal água de coco. Depois da “hidratação” arrisquei:  

–  Como é o seu nome? 

–  Gosto que me chamem de Manhã de Sol. – Achei esquisito, mas deixei fluir a veia poética: 

 – Se todas manhãs fossem belas como você, viveríamos numa eterna primavera. – ela sorriu e me olhou com ternura. Aproveitei o momento e segui em frente: 

– Que vai fazer hoje? – indaguei tentando entrar naquele verdadeiro céu que saía dos olhos azuis da coisa linda. 

– Não sei ainda – disse ela toda dengosa. Me enchi de esperança. 

– Qual o restaurante que você gosta? Estou com uma vontade enorme de comer uma saladinha e, quem sabe, tomar um vinhozinho. Naturalista adora tudo que termina em “inha” e “inho”. Na verdade, o desejo estava numa galinha caipira do Restaurante de Totóia, com arroz cozinhado na graxa e tudo! Mas a criatura valia a pena. Ela sorriu e disse: 

– Tem um lá em Ponta Negra que gosto muito. Tudo muito natural. Não tem sal nem tempero de forma alguma. E tem mais: eles não usam fogão a gás nem luz elétrica. É fogão à lenha e luz de velas. Adoro! 

Pensei no cenário e me deu até um desânimo. Mas, quando eu admirava a figura, a animação voltava. Topei o desafio e soltei: 

– Diga seu endereço que passo pra lhe pegar às oito horas. Ela disse e gravei no juízo, já que celular era assunto fora de questão naquele momento. 

Pois bem. Às oito em ponto parei o jipe velho sem capota – que tinha arranjado emprestado – na casa dela. Ela saiu com um daqueles vestidos de chita bem fininho e aí foi que a danada ficou mais linda ainda. 

Chegamos no tal restaurante, olhei os frequentadores e vi que tinha acertado na indumentária. Havia calçado umas sandálias de couro que tinha comprado às pressas, uma calça jeans e a camiseta com uma imagem da Amazônia. Estava a caráter. Depois do, digamos, jantar, fomos para a casa dela e dei um risinho por dentro imaginando o que me esperava. Estava tudo correndo dentro do esperado.  

Pois bem, lá chegando, sentamos numas almofadas jogadas no chão e parti logo para o ataque. Cheguei perto dela, peguei aquele rosto angelical e mandei-lhe um beijo na boca. Foi ótimo. Ousado, deixei a mão explorar o território. Tudo nos conformes. E ela gostou, pois me puxou com aquele carinho de quem queria mais.  

Já deitados sobre um tapete que parecia uma esteira, entre beijos e alisados, dei uma espiada para ver se tinha uma cama ou colchonete, qualquer coisa mais macia, mas percebi que o negócio ia ser pelo chão mesmo. Que fosse! Quando eu e a coisa linda já estávamos em trajes de Adão e Eva, notei um barulho vindo da porta. “Deve ser o vento”, pensei com otimismo, mas não era. Fiquei paralisado quando ouvi uma voz gutural dizendo:  

– Minha sereia, cheguei!  

Assustado, afastei a cabeça e uma figura gigante entrou casa adentro. O coração ficou a 200 por hora do medo que deu. A “sereia” percebeu e tentou me tranquilizar: 

– Tenha calma, Igor é meu namorado. Ele chega essa hora porque todos os dias pratica halterofilismo. É gente fina.  

Pela sombra, o gigante não tinha nada de fino. Era um ogro. Olhei para cima para conhecer o cara que iria me reduzir a pó e concluí que, além de forte, ele era sádico, pois esboçava um sorriso de satisfação enquanto me fitava. Mais uma vez a “sereia” tentou me acalmar. Veja só o que ela disse: 

– Igor gosta de sexo a três.  

Logo para mim que sou adepto do sexo com, no máximo, uma mulher! Depois disso, fiquei tão nervoso que não conseguia falar. Um pensamento idiota me veio: será que ela entende libras, aquela linguagem de sinais? Ora, não sei porque pensei isso, já que eu não tenho a menor ideia dessa arte de falar com as mãos. Era tudo desespero, instinto de sobrevivência! 

Imagine só a cena, meu amigo: eu e ela pelados sob um lençol, deitados no chão, e um cara 4X4 em pé nos olhando. Nessa altura, se é que alguma coisa podia subir, sexo já era coisa completamente descartada. Tudo que eu queria era escapar dali. E ficava cada vez mais complicado, pois para piorar o que estava horrível, a “sereia” chegou no meu ouvido e sussurrou:  

– Ele é bissexual, vai dar tudo certo. 

Aí já estava configurado que era caso de vida ou morte. Fiquei a imaginar coisas e comecei a passar mal. Vi que não era sonho quando o ogro emitiu uns sons e ela me traduziu dizendo que ele ia tomar banho e voltava para participar da festinha. Festinha? Eu é que não nasci com minhas coisas para esse tipo de uso. Então, vendo que era tudo ou nada, fingi calma e pedi um chá de camomila para equilibrar os nervos. Ela levantou-se e dirigiu-se à cozinha. Pois foi a última imagem que registrei dela. Dei um pulo, peguei minhas roupas e saí pela porta que o ogro tinha deixado aberta. Pelado, pulei dentro do jeep e só parei embaixo de uma árvore para botar a calça. Daí até minha garagem foram cinco minutos. UFA!! 

Na semana seguinte, vi que minha barriga estava meio volumosa e que precisava de uma academia, perder peso, fazer musculação, esses negócios. Decidido, fui dar minha “malhada” à noite. É o melhor horário. Depois a gente chega em casa, toma um bom banho, janta, assiste qualquer coisa e vai dormir. Essa vai ser minha atividade física. Nada de caminhadas mais! 

Botei a roupa de atleta, um par de tênis último modelo, fiquei todo arrumado. Sempre dá muita mulher bonita querendo ficar mais bonita ainda. Estava bem disposto. Quando botei os pés dentro da academia, passei os olhos e o que vi me deixou esperançoso. Era beleza que não acabava mais.  

Mas meu amigo, que surpresa me aguardava. Sabe quem estava lá? Exatamente ele, o ogro! Olhei para o sem-vergonha e o safado me deu um sorriso e piscou o olho.  Dei meia volta e fui correndo para casa.  

Para não ficar parado, passei a fazer Pilates e aula de dança. É chato demais, mas é seguro e não vejo o menor perigo daquele gigante aparecer. Depois do “Canto da Sereia” não consigo ver nem salada crua, nem nada que tenha relação com aquele pesadelo. Só como feijoada, cozido, panelada, essas coisas.  

Para finalizar e você ter ideia de como isso me marcou, outro dia fui comprar uma água mineral e o atendente me perguntou gentilmente: 

– Gelada ou natural?  

– Super gelada e das grandes! – respondi quase gritando. 

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Comentários (5)

  • JOSE OLAVO RIBEIRO Responder

    Ótima narrativa!

    17 de agosto de 2020 at 10:31
  • Emilia Mercia Responder

    Ótima!!!??

    16 de agosto de 2020 at 14:47
  • Ivanilsa Freire da Rocha Responder

    Relendo o texto…kkkkkkkkkkkk…essa foi boa!??‍♀️?imagina você que escolhe muito, cuidado pra não se enganar.Se correr em busca de dieta natural, pode se decepcionar e voltar atrás do trivial.?????‍♀️

    16 de agosto de 2020 at 14:09
  • Cristina Galvão Responder

    Muito bom! Kkkkk

    16 de agosto de 2020 at 11:40
  • Ivanilsa Freire da Rocha Responder

    Eu valorizo. Do é difícil cumprir.

    16 de agosto de 2020 at 11:33

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