Pílula que reduz risco de morte por Covid em 89% deve chegar ao SUS até julho

 

Medicamento está sendo usado em 17 países JENNIFER LORENZINI/REUTERS

A farmacêutica MSD (Merck Sharp & Dohme) trabalha com a expectativa de que o antiviral oral contra a Covid-19 desenvolvido por ela, o molnupiravir (nome comercial Lagevrio), esteja disponível no SUS (Sistema Único de Saúde) já no começo de julho. O medicamento foi aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) nesta quarta-feira (4) para uso emergencial em grupos específicos.

O próximo passo é a avaliação da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde).

As tratativas para a distribuição do medicamento no Brasil vão ser feitas pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), que firmou um acordo de cooperação tecnológica com a MSD nesta quinta-feira (5).

Em entrevista ao R7, o diretor da Unidade de Negócios de Infectologia da MSD no Brasil, Mario Ferrari, diz que, apesar de não haver uma data certa para o remédio estar disponível no país, a empresa trabalha com o horizonte de algumas semanas.

“A Fiocruz é que vai assumir essas conversas com o governo, mas essa é a nossa expectativa, que em semanas isso aconteça. Uma vez tendo um parecer positivo, o governo sinalizando para a incorporação, a gente está se preparando para receber qualquer demanda do SUS e poder atender de quatro a seis semanas. É mais ou menos o tempo que a gente precisa fazer para a droga chegar aqui.”

A estimativa de Ferrari leva em conta os prazos da Conitec para analisar outras tecnologias e medicamentos no contexto da Covid-19, que foram mais rápidos do que os tradicionalmente observados com doenças diferentes.

“O que a gente viu para Covid, para vacinas e até mesmo para os [anticorpos] monoclonais que passaram por essa avaliação foram [processos] relativamente rápidos. Estamos falando de semanas.”

O molnupiravir foi aprovado para uso em pessoas que mesmo vacinadas tenham risco de desenvolver formas graves da Covid-19, como pacientes oncológicos, portadores do vírus HIV, indivíduos transplantados ou imunossuprimidos, entre outros.

Caberá ao Ministério da Saúde definir quais grupos serão elegíveis a receber o remédio no SUS, o que impacta também na quantidade de tratamentos a ser encomendada, afirma o executivo.

Ele ressalta que a farmacêutica já produziu globalmente 10 milhões de tratamentos em 2021 e está fabricando mais 20 milhões neste ano.

“Nos dá um nível de conforto em dizer que a gente está preparado para atender à demanda do SUS. Qualquer que seja essa demanda, aparentemente, temos capacidade de atender.”

O foco da MSD neste momento é fornecer o molnupiravir somente para o SUS, acrescenta o diretor ao dizer que não há no horizonte um planejamento para a venda no mercado privado.

“Não existe no registro de uso emergencial essa limitação de que ele tenha que ser destinado ao SUS, mas é importante que a gente diga que essa é a nossa prioridade.”

Na avaliação dele, é fundamental ter tratamentos como o molnupiravir para vencer a pandemia.

“A gente tem falado muito do fim da pandemia, de conviver com o vírus. Só vamos poder ter essa segurança de que podemos conviver com essa doença de uma maneira relativamente de sucesso — e as pandemias foram controladas dessa forma — quando a gente conseguir diagnosticar, prevenir com vacina e tratar aqueles que eventualmente se infectam. Sem essa tríade, a gente não controla e não convive confortavelmente com o coronavírus.”

Molnupiravir

O antiviral foi desenvolvido por uma empresa de biotecnologia dos EUA sem fins lucrativos — a Drug Innovations at Emory — que recebe financiamento parcial do governo americano.

Posteriormente, a fórmula foi licenciada pela empresa Ridgeback Biotherapeutics, sediada na Flórida, que firmou acordo com a MSD para viabilizar os estudos clínicos e a produção.

Os testes avançaram para a fase 3 (final) em abril de 2021, após resultados promissores em voluntários que fizeram uso do medicamento nos primeiros dias desde o início dos sintomas.

O pedido de uso emergencial na Anvisa foi protocolado em 21 de novembro. O molnupiravir já foi aprovado por importantes agências reguladoras, como a dos Estados Unidos, do Reino Unido, da União Europeia e do Japão, e já está em uso em 17 países.

Os resultados mostraram que o molnupiravir foi capaz de reduzir em 89% o risco de morte por Covid-19 quando comparado ao placebo (substância sem efeito no organismo), inclusive sendo eficaz em pacientes infectados por variantes mais recentes do coronavírus, que escapam significativamente da proteção conferida pelas vacinas.

A aprovação da Anvisa para grupos de risco beneficia justamente indivíduos que podem ter o esquema vacinal contra a Covid-19 em dia, mas ainda assim evoluir para quadros de saúde críticos.

“Em um país continental como o Brasil, se falarmos de grupos de risco, estamos falando de milhões de pessoas que não vão ter uma proteção ideal [pela vacina] e que vão continuar sob risco. […] O tratamento vai dar um conforto para esse paciente que ainda tem o receio de desenvolver uma doença grave. São pacientes com câncer ativo, imunodeprimidos, transplantados, com doença cardíaca, obesidade, diabéticos…”, observa o diretor da MSD Brasil.

O tratamento deve ser iniciado em até cinco dias do início dos sintomas em pacientes que não estejam necessitando de oxigênio suplementar. O remédio não é indicado para gestantes.

São quatro comprimidos, duas vezes ao dia, durante cinco dias. Além de evitar mortes, a droga minimiza o risco de hospitalização.

Acordo com a Fiocruz

O acordo assinado nesta quinta-feira com a Fiocruz prevê que a entidade seja responsável pela armazenagem, administração, rotulagem, embalagem, testagem, liberação e importação do remédio para o SUS.

Além disso, duas pesquisas estão sendo conduzidas pela fundação. A primeira, em estágio mais avançado, envolve o uso do molnupiravir como profilaxia pós-exposição, ou seja, para indivíduos que tiveram contato com alguém infectado e podem desenvolver a Covid-19.

Elas poderiam tomar o remédio antes mesmo de apresentar qualquer sintoma, a fim de evitar que a doença se instale. Os resultados devem sair até o fim deste ano e poderão embasar um pedido de extensão do uso do molunupiravir junto à Anvisa.

O segundo estudo está em fase pré-clínica (antes dos testes em humanos) e é sobre o uso do medicamento para outras doenças causadas por vírus, explica Ferrari.

“A droga tem um mecanismo de ação muito interessante. Ela insere erros genéticos dentro do vírus e faz com que ele não se multiplique. Isso dá para a gente uma tese, que vai ser investigada pela Fiocruz, de que poderia funcionar para outros vírus. A Fiocruz vai investigar para dengue e chikungunya, que são vírus de RNA [assim como o Sars-CoV-2], e vai avaliar a ação da droga no [estudo] pré-clínico.”

 

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