Garotos que nasceram em condição de risco social, foram salvos pelo futebol, viraram milionários e, sem qualquer necessidade financeira, resolvem ludibriar casas de apostas para beneficiar familiares e amigos, conforme vão revelando as investigações. O mais impressionante é que os valores desses “benefícios” são ínfimos em relação aos ganhos mensais dos atletas mais famosos.
Um amigo do Giramundo, mais do que escolado nas mumunhas da vida, não perdeu a viagem: “Isso é a típica esperteza brasileira, o famoso jeitinho. Familiares ou amigos pidões começam a encher o saco querendo beliscar a vida farta do jogador, e ele, muito esperto, resolve atender os pedidos terceirizando o pagamento das benesses metendo a mão no bolso das casas de apostas. Alguém precisa informar esses coitados sobre quem está do outro lado: empresas multinacionais da jogatina com alto poder de monitoramento e habituadas a tratar com todo tipo de vigarista”. Terminamos rindo do quadro aqui na redação.
É difícil compreender o que leva um jogador com salário milionário a se envolver numa patacoada de valores insignificantes diante do seu saldo bancário. E a indigência intelectual de quem monta uma jogada dessas é revelada pela quantidade de indícios que ficam pelo caminho, algo que até um portento da imbecilidade como o lendário Inspetor Clouseau – imortalizado no cinema por Peter Sellers e Steve Martin – enxergaria sem abrir os olhos.
Neste momento, há um time de jogadores de segunda linha investigados pelas autoridades nesse B.O. denominado manipulação de resultados e apostas esportivas. Eles aprontaram suas presepadas nas Séries A e B do Brasileirão, e o mesmo amigo do Giramundo acredita que esses aí, que ganham salários bem menores, estavam em busca de uma “graninha extra” para completar o orçamento doméstico. Cinco já foram banidos do futebol.
Desse naipe de cartas viciadas surgem nomes que estão degraus acima da maioria dos investigados, fazendo reluzir estrelas nas capas dos processos como Lucas Paquetá (West Ham, Inglaterra), Luiz Henrique (Botafogo) e Bruno Henrique (Flamengo). Segundo as investigações, a jogada era a mesma: apostas em cartões amarelos que receberiam em determinados jogos.
As patacoadas são dignas de Clouseau. Parentes e amigos de Paquetá fizeram suas apostas num lugarejo de 3,6 mil habitantes na Baía de Guanabara. Foi a Betaway, que também patrocina o West Ham, quem alertou as autoridades britânicas sobre o “número incomum” de 60 apostas em cartões amarelos vindas da Ilha de Paquetá, onde o jogador nasceu.
Segundo o UOL, um tio e um primo de Paquetá realizaram transferências num total de R$ 40 mil para Luiz Henrique, poucos dias após o agora botafoguense receber cartões amarelos ainda jogando pelo Betis, Espanha.
Hoje (5/11) estourou a bomba de Bruno Henrique, voando nos estilhaços apostas feitas em Belo Horizonte (sua terra natal) e nomes de parentes certamente dotados de uma clarividência suspeita até para Mãe Dináh. Segundo a CNN, seu irmão, cunhada e prima criaram, na véspera da partida contra o Santos (Brasileirão 2023), contas em casas de apostas virtuais e “previram” que ele levaria pelo menos um cartão.
O portal ge noticiou que três casas de apostas perceberam movimentações incomuns a respeito de que o jogador tomaria cartão amarelo. A KTO registrou exatamente três novas contas fazendo suas primeiras apostas num cartão que o jogador tomaria naquele jogo. A Betano detectou contas baseadas em Belo Horizonte com “apostas claramente direcionadas, a partir de novos clientes e de clientes já estabelecidos, fora dos padrões normais para Bruno Henrique receber um cartão”, e retirou do ar essa possibilidade de aposta assim que percebeu a movimentação incomum. Já a GaleraBet percebeu quatro contas novas registradas no Brasil, todas num período de 24 horas antes do jogo, apostando que Bruno Henrique levaria um cartão.
O jogador fez sua parte com sobra. Depois do amarelo, distribuiu gentilezas ao juiz: “Você é um merda!”. Prudente, sua senhoria resolveu consultar o “Pode isso, Arnaldo?” e não teve alternativa além de apresentar um reluzente cartão vermelho.
Velhaco, aquele mesmo amigo do Giramundo está atento para o caso de BH aparecer patrocinado por alguma marca de bandagens e suturas ou loja de tatoo, depois que “tatuou” a cabeça de Matheuzinho com as travas da chuteira em jogo recente contra o Corinthians. De quebra, o gaiato alertou o Ministério Público para verificar se houve aposta sobre o local da lapada, número de pontos no cocoruto do infeliz, quantos fios de cabelo voaram pelo gramado, minuto 27 da expulsão do camisa 27… Nunca se sabe, não é?
Agora, todos correm o risco de banimento do futebol e puxar cadeia. No fim dessa linha, os maiores prejudicados são os clubes, penalizados com jogadores fora de jogos e até com carreiras encerradas antes da hora. Tudo porque resolveram defender um troco muquirana para parentes e “parças”.
A praga das manipulações esportivas não é nova e nem privilégio nosso. Existe uma penca de casos que explodiram em diversas modalidades. Basta revirar as páginas sobre NFL (diversos casos desde os anos 1960), MLB (1989), Calciopoli (2006) e NBA (2007). Em todos os casos, as apostas estiveram no centro dos escândalos.
Na verdade, os jogos de azar são muito complexos. Inúmeros especialistas fazem uma estreita associação com saúde pública, em razão dos distúrbios que podem gerar nas sociedades pelos efeitos da dependência e da devastação financeira que causam nos viciados e suas famílias.
No Brasil, onde o jogo é proibido, estamos testemunhando a explosão das bets, que chegaram de forma arrasadora patrocinando tudo. Pelo visto, não têm do que reclamar. Segundo matéria do jornal O Globo, “o volume mensal apenas de transferências via Pix de pessoas físicas para empresas de apostas on-line variou entre R$ 18 bilhões de R$ 21 bilhões neste ano, conforme estimativas do Banco Central”. E acrescenta que “beneficiários do Bolsa Família transferiram R$ 3 bilhões só em agosto”.
Há quem acredite em fazer apostas e ganhar dinheiro para pagar dívidas, realizar sonhos e até mudar de vida. É a lamentável inocência sem inocentes que não enxerga os perigos do vício e atiça as estatísticas de endividamento e doenças mentais. Onde isso vai dar? Façam suas apostas.
Comentários (2)
Para fechar um porta é só acabar com apostas em cartão amarelo e vermelho,
Não resolve mas diminui
É uma boa alternativa.