LP nos conta um “causo”: A História de João Calote e Sete Palmos

Ilustração

Há pessoas que nascem com o espírito alegre e, por mais dura que a vida se apresente, eles sempre têm um sorriso e uma palavra de otimismo. Sem falar daqueles que gostam de repartir histórias – ou estórias – com os amigos. Esse assuntos foram batizados de “causos”.

LP é um desses caras. Uma grande figura. Não sei o seu nome. Para mim será sempre LP. Esse apelido foi motivado pelo fato dele nunca ter abandonado os velhos “bolachões”, rejeitando as modernidades. “Bom é o chiadinho do disco”, diz ele, entre uma música e outra de Nelson Gonçalves, de quem é ardoroso fã. É meu amigo de longas datas e estreitamos essa amizado por conta do do futebol. Infelizmente não o vi jogar na juventude. Dizem que ele era um craque lá pelas bandas de Alagoas, mas já o conheci aqui, em final de carreira.

LP parou de jogar e deu para ficar em casa sentado numa cadeira de balanço e se lembrando dos “causos” que passaram por sua vida. Um dia, atrás de uma conversa boa, fui na casa de LP. Lá estava ele do jeito que gosta.

Ficou alegre em me ver e fez uma festa danada. Queria até abrir uma garrafa de cana pra gente tomar com uns cajus do quintal dele, mas declinei do convite. Vontade eu tive, mas tinha uns negócios de banco para resolver depois e uma coisa não se mistura com a outra. A recepção foi exatamente do seu jeito.

– Meu amigo Minervino! – disse ele com aquela cara de gozador. – Lembrei de uma história verdadeira e tenho certeza que você vai gostar! – interessante que ele fazia questão de frisar esse detalhe “verdadeiro”.

– Pois conte logo, ômi de Deus. – falei, já ansioso.

E lá foi LP contar mais um causo:

Rapaz, fui jogar em Penedo e fiz amizade com um cara que era gente muito boa, mas tinha um defeito: era totalmente desmantelado com o dinheiro. Pela vida que levava era conhecido como João Calote. Devia em tudo que era canto e, como não poderia deixar de ser, terminou nas mãos de um agiota. Situação complicada.

Minerva, esse agiota era cabra ruim, da pior espécie. Pelo nome dá logo pra imaginar a peça: Sete Palmos. O apelido era por conta dos seus “rígidos métodos de cobrança”. Se o pobre devedor não honrasse o compromisso, ele mandava bala. E cada bala era pela quantidade de zeros que o defunto devia – isso é que o povo conta.

– Nessa hora LP até se benzeu. – depois continuou:

Pois um dia, numa segunda-feira, esse meu amigo João Calote morreu. Foi dormir e não acordou. Por razões que imagino, mas não digo, a família providenciou o enterro logo de manhã. E eu, claro, estava lá. Ainda bem que ele nunca me pediu nem um centavo emprestado. Aí começa um drama. No meio do velório meu telefone tocou e imagine quem era: Sete Palmos! Chega deu um calafrio da nuca ao começo da bunda.

Atendi com um bom dia que não condizia com o momento, mas o medo é bicho do cão. Sete Palmos foi logo dizendo:

– LP, preciso de sua ajuda pra evitar uma desgraça. – dessa vez o arrepio passou pela bunda e foi até o dedão do pé. Fui logo dizendo:

– Às ordens, meu chefe. O que posso fazer? – Sete Palmos disse:

– João Calote, que é seu amigo, me deve dez mil e já está atrasado seis dias. Se chegar no sétimo, ele recebe quatro balas de presente. Avise a ele. – o arrepio virou dor de barriga. Pense num medo grande!

– Pode deixar, doutor.

Nem falei que João tinha morrido com medo de dar a notícia a ele. Sei lá o que se passa na cabeça de uma cara como Sete Palmos. Dizem que portador não merece pancada, mas com um agiota daqueles é melhor não arriscar.

Mas veja, meu amigo Minerva, como a vida é: não é que uma hora depois do enterro de João Calote foi Sete Palmos quem bateu as botas? Contam que teve um negócio no coração olhando as contas. Quando me disseram, até a dor de barriga deu uma melhorada.

Pouco depois da notícia da partida do agiota, a campainha do telefone toca. Fiquei gelado pensando em Sete Palmos me ligando do outro mundo. Mas era Davi,  o filho de João Calote que, de tão nervoso, quase não conseguia falar. Ele ainda não sabia do acontecido com o credor do pai.

– LP, Sete Palmos ligou pra mim e disse que se papai não pagasse a dívida eu era o responsável. E agora?

– Então, com tranquilidade, eu respondi: Davi, não se preocupe, ele foi cobrar ao seu pai pessoalmente.

Compartilhe:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *