PENSE! “Eu mandei soltar!” X “Eu mandei prender de novo!” – As Posições Divergentes Entre Dois Ministros

Foto de André Dusek – Estadão – Edição: EV

O presidente do STF, Luiz Fux, reverteu –  apenas oito horas depois – uma decisão do ministro Marco Aurélio e mandou prender de volta o traficante André do Rap, um dos chefes da maior facção criminosa de São Paulo. O detento André do Rap estava preso na penitenciária de Presidente Venceslau, em São Paulo, e deixou a prisão rapidamente no sábado, no mesmo dia da decisão de Marco Aurélio. Agora, segundo a Polícia Civil de São Paulo, o traficante está foragido. Entenda o caso:

Por que Marco Aurélio mandou soltar André do Rap?

O ministro se baseou em artigo do pacote anticrime, sancionado no final do ano passado, sobre a previsão de que a prisão preventiva deve ser fundamentada a cada 90 dias. A justificativa é o caráter excepcional da prisão, já que ainda cabem recursos ao preso.

Após o pacote anticrime, a redação do Código de Processo Penal – no ponto que interessa ao caso – é a seguinte: “Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal”.

Por que Fux mandou prender de novo o traficante?

Para Fux, a decisão do ministro Marco Aurélio pode causar grave lesão à ordem e à segurança. Destacou que “se trata de alguém de altíssima periculosidade, com dupla condenação na segunda instância por tráfico internacional de drogas, que ficou foragido por mais de cinco anos”.

Sobre o prazo de noventa dias para revisar a prisão preventiva, Fux argumenta que esse ponto não foi discutido pelas instâncias inferiores. É como se Marco Aurélio, segundo Fux, tivesse “atropelado” a primeira e segunda instância, o que não é permitido. Para Fux, houve uma “supressão de instância”.

Marco Aurélio, a seu turno, rebate os argumentos de Fux  lembrando que, no ano passado, o STF decidiu que a prisão deve ocorrer apenas após o trânsito em julgado, e não em segunda instância.

Quem não pediu a renovação da prisão preventiva?

O ministro Marco Aurélio disse que, segundo a nova lei, caberia à polícia e ao Ministério Público terem pedido a renovação da prisão do traficante.

“A renovação da prisão provisória pode ocorrer de ofício pelo juiz ou mediante provação deste pelo MP ou pela autoridade policial. Não havendo a providência, a prisão é ilegal” – justifica o ministro.

Já houve decisão divergente? 

Sim. Em outro caso julgado neste ano, para soltar um outro  traficante, o ministro Edson Fachin entendeu que a prisão por mais de 90 dias não daria direito à liberdade do preso.

No caso, Fachin sustentou que “a ausência de reavaliação, a tempo e modo, da custódia cautelar, não retira do juiz singular o poder-dever de averiguar a presença dos requisitos da prisão preventiva.

Quem é o traficante solto por Marco Aurélio?

André Oliveira Macedo é acusado de chefiar, em Santos (SP), a maior organização criminosa de São Paulo. Ele cumpria prisão preventiva em penitenciária em Presidente Venceslau, interior de São Paulo, mas já tinha condenação em primeira instância a 14 anos de prisão. A pena foi reduzida na segunda instância a 10 anos de prisão.

Mas ainda não há trânsito em julgado – porque o recurso especial e o recurso extraordinário ainda não foram julgados, respectivamente, pelo STJ e pelo STF.

Fux pode cassar uma decisão de Marco Aurélio?

Como presidente do STF, Fux tem o poder de suspender liminares (decisões temporárias) dos demais ministros.

Marco Aurélio disse, porém, que a decisão conflitante com a sua é “lamentável” por expor uma “autofagia” que leva ao descrédito da Corte.

O que significa essa divergência entre magistrados?

Luiz Fux assumiu em 10 de setembro a Presidência do Supremo. Na Corte, ele é visto como simpático à Operação Lava-Jato e habituado a aplicar penas mais rigorosas aos condenados.

O ministro Marco Aurélio, por outro lado, pertence à ala do STF considerada mais “garantista”. É o jargão jurídico para definir quem considera que o cumprimento do devido processo legal é mais importante do que a gravidade das denúncias. É uma teoria sustentada principalmente por advogados penalistas.

Retardar condenações e/ou conseguir o alcance da prescrição costuma garantir consistentes honorários contratuais.

Interpretações diferentes são normais?

O STF é um órgão colegiado composto de onze ministros – atualmente dez, em face da aposentadoria, hoje (13) de Celso de Mello. Divergências existem.

Ademais não há vedação quanto à aplicação de interpretações diferentes, em casos análogos, exatamente por conta da alternância das turmas ou ministros  nas decisões.

 

Fonte: espacovital.com.br

 

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Comentário (1)

  • carlos alberto cunha Responder

    O perigo do relativismo é que a propensão ao casuísmo é evidente. A interpretação da lei pelo Juiz só é cabível nos casos em que ela é omissa, portanto, não prevalece nas questões que estão claras e cristalinas no bojo da lei. O julgador deve garantir a aplicação da lei e não tergiversar na interpretação da lei.

    13 de outubro de 2020 at 11:50

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