Barba e bigode

Sempre estou pensando. Nem que seja “nonsense”.

Dias passados escrevi sobre a passagem do tempo. Sua velocidade estonteante. E disse da minha ansiedade em chegar aos dezoito anos. Nessa ansiedade, embora com menor intensidade, estava minha expectativa em fazer a barba. E, quem sabe, nutrir um bigode. Os pelos custavam a sair mas, em redor dos 17, 18, andei fazendo uma experiência com os apetrechos de barba de meu pai, às escondidas.

Finalmente, pouco tempo depois, fui obrigado a começar a fazer a barba. E aí a preguiça se apresentou firme. Já não fazia a barba todos os dias, e ficava com uma aparência que, me perdoem os que usam barba, para mim era de sujo. Um dia, hospedado em nossa casa, pois era grande amigo de meu pai, Aristides Barcellos, alto funcionário do Banco do Brasil, olhou para mim cedinho pela manhã e perguntou, esqueceu de fazer a barba? Dei uma desculpa esfarrapada, de que se fizesse a barba todos os dias a pele ficava ferida. Deu-me uma resposta definitiva: primeiro, se você fizer a barba todo dia a pele acostuma e depois, essa sua aparência de desleixo desaparece. Encabulado, adotei o seu ensinamento, que vale até hoje. Nem em bigode pensei mais. Especialmente agora, que há uns barbichas por aí fazendo das suas. Sem preconceitos.

Mas, sem duvida, é um ritual cansativo. Uma obrigação chata. Já experimentei tudo quando é instrumento para diminuir a estafa. Comprei barbeadores elétricos de todos os tipos e modelos. Nunca fico satisfeito com os resultados, e sempre retorno à velha e confiável gilete. É a única forma de você deixar a pele macia como bunda de menino, ou menina, novo (sendo politicamente correto).

Quem dizia isso era João Lira, que a maioria de vocês não conheceu ou sequer se lembra. Fiscal das companhias de cinema, acompanhava a freqüência dos cinemas de Natal. Todos os domingos, por exemplo, estava na porta do “Rio Grande”, vendo a entrada e cuidando para que as companhias não fossem passadas para trás. Sempre no seu linho branco Taylor S-120 e barba super bem feita, elegantérrimo. E foi lá que ele me contou essa história de pele lisa como bunda de menino/a novo. João era irmão de Paulo Lira, pianista, de conhecida tradição natalense. Ambos duas belas figuras de nossa cidade.

Por essas razões, e para me sentir bem comigo mesmo, mesmo em casa a maior parte do tempo, faço a barba todos os dias, sem perdão e sem desculpa. E aí posso me olhar no espelho. Sem sustos.

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Comentários (3)

  • ANTONIO PIPOLO JUNIOR Responder

    Caro Professor, desculpe a intimidade de antes, pensei estar tratando com Dalton Filho de quem fui colega de Marista e amigo de infância.

    2 de junho de 2020 at 20:57
  • Antonio Pipolo Junior Responder

    Caro amigo Daltinho, adorei o “Barba e bigode”. Que elas nunca cresçam para não serem depósitos do que não serve. Forte abraço. Sempre que posso pergunto a Júlio de seu paradeiro. Forte abraço!

    18 de maio de 2020 at 12:46
  • Manoel de Oliveira Cavalcanti Neto Responder

    Beleza!

    13 de maio de 2020 at 07:33

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